Cuidados Paliativos e os contributos do Gerontólogo

A propósito do Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, a Associação Nacional de Gerontólogos colocou algumas questões, contribuindo para a reflexão sobre o papel dos Gerontólogos neste domínio do cuidado. Apresentamos testemunhos de Gerontólogas que estudam e trabalham no âmbito dos Cuidados Paliativos. 


Ana Ramos é licenciada em Gerontologia Social pela Escola Superior de Educação de Coimbra, a frequentar atualmente o 2.º ano do Mestrado em Cuidados Paliativos na Escola Superior de Saúde de Leiria. Realizou recentemente estágio numa Unidade de Cuidados Paliativos da Associação de Socorros da Freguesia da Encarnação (ASFE), tendo como desafio a Prevenção de Burnout na Equipa e a elaboração de um Guia de Boas Práticas. 

Esta Unidade de Saúde contempla várias tipologias: Unidade de Cuidados Paliativos, Unidade de Cuidados Continuados (Convalescença, Média Duração e Reabilitação e Longa Duração), Residência Sénior, Clínica, Apoio Social e Transporte de Doentes. 

1. Como surge a experiência em cuidados paliativos? 

A experiência em Cuidados Paliativos surge inicialmente através da realização de ações paliativas em respostas sociais, tais como ERPI, SAD e CC, em contexto de aprendizagem e desenvolvimento de competências através do estágio na ASFE, na Unidade de Cuidados Paliativos, e no projeto de investigação que está a decorrer, com o intuito de conhecer a realidade dos cuidadores informais que prestam cuidados a doentes paliativos no domicílio. 

2. A partir da sua experiência, quais são as funções do Gerontólogo no âmbito dos cuidados paliativos? 
As principais funções de acordo com a experiência do Estágio na Unidade de Cuidados Paliativos: 

- Participação em Reuniões Clínicas/ Passagem de Turno; 

- Participação na Admissão/ Acolhimento da Pessoa e da Família; 

- Avaliação da Pessoa e da Família e Implementação das Intervenções do Plano de Cuidados (estudo de caso); 

- Aplicação do Instrumento: Escala de Qualidade de Vida Profissional: PROQOL 5 que avalia a Satisfação por Compaixão e a Fadiga por Compaixão, à equipa de Cuidados Paliativos; 

- Realização de Digital Storytelling para homenagear a equipa, as pessoas cuidadas e as famílias;Identificação das necessidades da equipa em relação às formas de prevenção de burnout;

- Implementação de Estratégias de Prevenção de Burnout através de dinâmicas de grupo; 

- Elaboração de um Guia de Boas Práticas para Prevenção de Burnout. 

O Gerontólogo contribui também para o levantamento das necessidades dos cuidadores informais que cuidam de doentes paliativos no domicílio, através da aplicação de instrumentos de avaliação. Especificamente em contexto de ERPI, SAD e Centro de Convívio, o Gerontólogo tem um papel importante na avaliação, planeamento e acompanhamento da pessoa e da família, e realização de intervenções não farmacológicas. 

3. O que destacaria no trabalho com pessoas em cuidados paliativos?

Considero que o trabalho em equipa é fundamental, sendo um dos Pilares dos Cuidados Paliativos, bem como o controlo sintomático, a comunicação empática e o apoio à Família. No contexto apresentado, a existência de uma equipa multidisciplinar é imprescindível para uma melhor atuação ao doente e família. Nas dinâmicas de grupo realizadas para prevenção de Burnout permitiram fortalecer o trabalho em equipa, em que foi possível potenciar a coesão grupal, relacionamento interpessoal, fortalecer laços e espírito de entre ajuda. Como tal, a equipa deve ser compassiva no autocuidado e no cuidado ao outro. 

4. Em que medida o Gerontólogo acrescenta valor no contexto de Cuidados Paliativos? 

A abordagem gerontológica e paliativa foca-se no cuidado à pessoa, e não na patologia, reconhecendo o papel da família neste processo, visando o alívio e o conforto. Sendo fundamental, o trabalho em equipa através das competências técnicas de cada área profissional. 

O Gerontólogo poderá acrescentar valor no contexto de Cuidados Paliativos através da inovação nas respostas sociais e de saúde, ou seja, através de estratégias que respondam de forma criativa às necessidades, potencialidades e expetativas das Pessoas Idosas e comunidade em geral, no sentido da promoção da sua qualidade de vida, realização e bem- estar. É fundamental a implementação de boas práticas tendo por base os indicadores de qualidade, através da evidência científica. O paradigma dos cuidados deve ser alterado, os mesmos devem ser personalizados utilizando para tal os Pilares dos Cuidados Paliativos e os Pilares da Humanitude.


Sara Campos é gerontóloga, licenciada em Gerontologia Social pela Escola Superior de Educação de Coimbra e mestre em Gerontologia pela Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro. Atualmente, é Diretora Técnica do SAD da Habicuidados Aveiro - uma instituição que atua em Aveiro e nos concelhos adjacentes e que, através de um Serviço de Apoio Domiciliário (SAD), tem como objetivo dar suporte a situações de elevada exigência humana em ambiente de grande intimidade e fragilidade emocional. Cada proposta de intervenção é única e ajustada à pessoa. 

1. Como é constituída a equipa da HabiCuidados Aveiro? 

A HabiCuidados Aveiro conta com uma equipa técnica constituída por 2 gerontólogas que têm experiências/vivências profissionais diferentes, uma mais de gestão pura e dura e outra mais de intervenção direta com o cliente, o que leva a um ótimo complemento, trazendo um contributo e um trabalho mais abrangente e enriquecedor. Contamos, ainda, com uma enfermeira, que é um grande suporte em tudo que seja questões saúde e seu devido acompanhamento.

As nossas cuidadoras têm formação e larga experiência na área, elas são os nossos braços direitos e esquerdos, a imagem da empresa diariamente no terreno.O trabalho em rede e com proximidade entre equipa técnica, cuidadoras e família é o fulcral para a qualidade dos nossos serviços.​

2. O SAD não é um serviço de cuidados paliativos. Mas, a verdade, é que acompanha pessoas em situação paliativa. Em que medida o Gerontólogo acrescenta valor no contexto de Cuidados Paliativos?

Em contexto de SAD, os serviços típicos contratados são direcionados ao acompanhamento, higiene e conforto do utente. Em clientes paliativos, para além dos serviços típicos, acresce a necessidade e suporte para uma personalização minuciosa de conforto e criação de um ambiente ajustado à condição clínica do cliente. O que leva a uma maior exigência na especificidade do plano individual de cuidados. 

O Gerontólogo em contexto de SAD tem a função de agente impulsionador e mediador dos cuidados em rede - SNS, utente, família e cuidadora. Em articulação com a equipa interdisciplinar, realizam uma avaliação holística e traçam plano de intervenção e de cuidados ajustado ao utente, bem como desenhar plano formativo direcionado às cuidadoras para cada estágio, por exemplo, quando existe alteração de estado funcional do utente, em que passa de utente semi-dependente para dependência total.

Em caso de utente paliativo, é realizado um trabalho mais minucioso na prestação dos cuidados por parte da equipa de acompanhamento. As cuidadoras são orientadas para uma maior sensibilidade e leitura do exato estado do utente, reorganizando as rotinas diárias, por exemplo prolongar período de descanso; administração medicamentosa e/ou estratégias não farmacológicas de conforto de dor; readaptar as atividades de vida diária; respeitar sua intimidade, devido alterações fisiológicas, assim como a sensibilidade pelo estado em fim de vida e aceitação da mesma.

O Gerontólogo assume o papel de gestor de caso. É a ponte entre cliente, família e prestadores de cuidados. Garante um pilar de suporte para a família e cliente; para profissionais de saúde e cliente; para prestadoras de cuidados e cliente.

Principalmente no acompanhamento, orientação e aconselhamento aos envolventes em todo o processo, para uma maior sensibilização e respeito ao contexto paliativo, porque ainda existe pouca literacia e aceitação da vontade do cliente na prestação de cuidados paliativos em contexto domiciliário.


ANGerontólogos

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