Defesa dos direitos das pessoas mais velhas - A importância da Comissão de Proteção ao Idoso

I - O ordenamento jurídico

Não há no nosso ordenamento jurídico um estatuto específico da pessoa idosa. E não é certo que deva haver. O que é imperativo é que os direitos contemplados pela ordem jurídica sejam acompanhados de uma estrutura política, social e económica que garanta o seu efetivo exercício. Assegurar o respeito pela integridade, autonomia, dignidade e liberdade individual das pessoas idosas, concretiza-se através de leis adequadas mas sobretudo de políticas e programas que atendam especificamente às suas vulnerabilidades e promovam a sua participação na sociedade. A Constituição da República Portuguesa define no seu artigo 72º uma política para a terceira idade, consagrando que as pessoas idosas têm direito à segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem o isolamento ou a marginalização social, especificando que essa política deve englobar medidas de carácter económico, social e cultural tendentes a proporcionar às pessoas idosas oportunidades de realização pessoal, através de uma participação ativa na vida da comunidade. A verdade, porém, é que essa política nunca teve concretização. Nas políticas da justiça tem-se vindo a acentuar a consideração de que numa sociedade cada vez mais envelhecida na área dos adultos vulneráveis reclama do sistema judicial uma atuação polifuncional, com particular destaque, nas jurisdições criminal e cível. A lei que define os objetivos, prioridades e orientações de política criminal passou a incluir os crimes praticados contra idosos, como de prevenção prioritária (Lei n.º 96/2017, de 23 de agosto). No âmbito da jurisdição penal assistiu-se a uma preocupação destinada a proteger as pessoas idosas contra atos de violência, nas suas diferentes formas. Mas mais do que sancionar o agressor, com o agravamento das penas, interessava criar um quadro normativo integrado de prevenção, proteção e acompanhamento cujo escopo fosse a proteção da pessoa idosa nas suas diferentes dimensões. Este reconhecimento, que vem de há muito, traduziu-se no âmbito civil na aprovação do regime jurídico do maior acompanhado (Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto). Trata-se de um instituto de proteção dos adultos que dá resposta às limitações decorrentes da diminuição da capacidade dos mais velhos por força do envelhecimento. O direito civil procurou ajustar-se aos novos paradigmas sociais, consagrando um novo modelo de acompanhamento de maiores, adaptado às concretas aptidões e exatas limitações do indivíduo idoso, reconhecendo-lhe o correspetivo grau de autodeterminação. A reflexão e discussão que tem sido feita no quadrante jurídico, sobretudo nos últimos tempos, tem-se centrado não no Direito do Envelhecimento, na sua dimensão juridicamente autónoma, antes no Direito ao Envelhecimento na sua dimensão de garante, enquanto direito pessoalíssimo de cada indivíduo a envelhecer com dignidade.

II - As pessoas especialmente vulneráveis

Deve ser frontalmente assumido que a idade avançada tem especificidades que devem ser tuteladas no plano da proteção jurídica. Se é verdade que o envelhecimento não determina, por si só, a perda de autonomia ou a incapacidade, o facto é que se assiste a um aumento exponencial do número de idosos em situação de dependência e seguramente em situação de capacidade diminuída.Há com efeito limitações de caráter físico e mental decorrentes do devir da idade que podem impedir a pessoa de exercitar autonomamente os seus direitos. Tal circunstância, porém, não significa nem deve determinar que esta fique, por esse motivo, legalmente impossibilitada de exercer todos os direitos de que é titular, justificando-se que nestes casos seja ponderado o recurso a uma medida de acompanhamento. Todavia, tal não deve levar à opção por um direito idadista, que identifique as pessoas idosas como um grupo homogéneo, criando leis específicas só com base no fator da idade. Escamotear as vulnerabilidades evidentes das pessoas de idade mais avançada não lhes assegurando a devida proteção apresenta-se tão grave como construir um quadro legal exclusivo dos idosos, assente inexoravelmente na conceção de que a velhice, por si só, constituiria um fator redutor da capacidade jurídica. O que demanda proteção não é a idade, em si, é a especial vulnerabilidade que muitas vezes acompanha o avanço da idade.

III - A importância da Comissão de Proteção ao Idoso

A nova realidade existente exige a adoção e criação de novos modelos de intervenção e o reajuste das respostas sociais, sendo necessário uma intervenção mais qualificada e vocacionada para as especificidades dos novos idosos. Não existe, neste momento, em termos institucionais, uma Comissão para a Proteção dos Idosos. Considerou-se numa primeira fase que a criação de organizações estatais de proteção dirigida a pessoas idosas, como uma Comissão de Proteção de Idosos, por si só, estigmatizaria este grupo etário. Defendia-se que se tratava de um grupo muito heterogéneo, cuja proteção nas suas fragilidades passaria essencialmente pela existência de políticas de rendimento e de saúde. Os números da violência, dos maus tratos, do abandono, das burlas, e toda a espécie de abusos cujas vítimas são idosos obrigam a repensar este entendimento.A sociedade civil acusou este vazio de proteção social e, por essa razão, nos últimos anos, a própria comunidade tem-se organizado na defesa dos interesses das pessoas idosas.Foi neste contexto que nasceu a CPI - Comissão de Proteção ao Idoso, Associação Regional do Norte. A Comissão de Proteção ao Idoso destina-se a promover e divulgar os direitos dos idosos, a prevenir a sua violação e a promover ações e atividades que valorizem o papel e bem-estar dos idosos no meio em que estão inseridos, assegurando a representatividade da população idosa na definição das suas políticas para o envelhecimento. O papel e empenhamento da CPI tem-se mostrado fundamental na defesa dos direitos dos mais velhos, atuando em parceria com o Ministério Público, a APAV, as Universidades, o Instituto Superior de Serviço Social e muitas outras instituições com quem tem protocolos de cooperação celebrados. É hoje inquestionável que a sociedade civil, em particular as pessoas idosas e as suas organizações representativas, devem estar envolvidas no processo de conceção e implementação de políticas para um envelhecimento positivo e sustentado e participar ativamente no processo de monitorização do seu cumprimento. O direito a viver de forma digna e inclusiva, não deve ser meramente declarativo mas efetivo, tendo a comunidade reivindicado ativamente a tomada de medidas eficazes e apropriadas ao pleno gozo desse direito. A Comissão de Proteção ao Idoso, mais não é que um instrumento e um garante desse desígnio.

Comissão de Proteção ao Idoso

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