Violência contra as pessoas idosas, que estratégias de prevenção?

O aumento da esperança de vida, sinal inequívoco de desenvolvimento das sociedades traz, igualmente, desafios grandes à coesão intergeracional e social que temos que enfrentar. Um desses desafios é o aumento da violência contra os cidadãos mais velhos, na razão direta do aumento da vulnerabilidade emergente das situações de demência e de dependência.

Falamos naturalmente da ocorrência de crimes contra o património, como furto e roubo e também de crimes contra a vida e contra a integridade física, que podem vitimar qualquer pessoa, independentemente da sua idade. Mas no caso das pessoas idosas estes crimes aparecem muitas vezes associados à prestação de cuidados e os seus autores são os próprios cuidadores.

A exploração financeira de que muitas pessoas idosas são alvo, a apropriação indevida dos seus bens e a privação da liberdade de movimentos a que são sujeitas no contexto familiar e nas estruturas responsáveis pelo seu acolhimento, são o resultado de uma desvalorização da sua autonomia, da banalização das representações ilegítimas e de um silêncio cúmplice por parte de todos nós.

Sob o álibi da proteção, da salvaguarda dos interesses e da satisfação das necessidades básicas, atropelamos os direitos fundamentais da palavra, da auto determinação, da imagem e da liberdade.

Quando falamos de violência contra as pessoas idosas falamos das decisões tomadas à revelia das pessoas, das doações em vida sem reserva de usufruto, das intervenções de saúde sem consentimento informado, da inexistência de representantes legais quando sobrevêm situações de incapacidade.

Todas estas ações estão tipificadas como crime no direito penal português, pelo que a questão que se coloca não é a da criminalização das condutas, mas da sua prevenção e da efetiva sanção dos comportamentos dolosos. A melhor estratégia é educar. Educar os futuros idosos e todos os portugueses para o exercício de uma cidadania consciente e pró-activa. Sensibilizá-los para o conhecimento dos seus direitos e deveres, alertar para a necessidade de adotarem uma conduta preventiva e informada.

Depois, é fundamental denunciar os atos que põem em causa dolosamente ou de forma negligente os interesses das pessoas mais frágeis, onde incluímos muitos dos idosos afetados pela doença ou pela insuficiência económica.

Denunciar sem medo, de forma assertiva, de modo a que seja possível punir os culpados e transmitir à sociedade uma mensagem pedagógica de dissuasão.

Neste processo, o gerontólogo é fundamental, quer como agente informativo, mas também como apoio à pessoa idosa durante o longo e doloroso processo de denúncia.

Um gerontólogo informado impede as organizações onde trabalha de agirem de forma ilegal ou de desvalorizarem a pessoa idosa como dono do seu projeto de vida e pode contribuir com o seu saber para a passagem de uma mensagem de esperança, de inclusão e de respeito por todas as idades da vida.



Sobre a autora: 

Licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa iniciou a sua carreira profissional como advogada, tendo passado pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, onde desempenhou funções de jurista na área da Ação Social, Chefe de Divisão da Ação Social Local e Assessora da Provedora. Mais tarde, assumiu o cargo de Chefe da Divisão de estudos e planeamento do desenvolvimento do Instituto para o Desenvolvimento Social em Lisboa. Desempenhou funções como Vice-Presidente do Instituto de Reinserção Social, tendo sido responsável pela coordenação nacional de centros educativos, do centro de documentação e da área da cooperação. Foi também membro do Conselho Nacional de Saúde Mental, Mercado Social de Emprego e da Comissão Nacional para a Política da Terceira Idade. Até 2009, ocupou o cargo de docente da licenciatura e pós-graduação em Gerontologia Social, sendo responsável pelas cadeiras de Direito e Direito das pessoas idosas em algumas universidades e institutos do setor público, privado e cooperativo, nomeadamente na Universidade de Aveiro e na Universidade Católica. Atualmente desempenha funções no Montepio sendo Diretora do Gabinete de Responsabilidade Social desde Junho de 2006, Administradora Não Executiva das Residências Montepio, formadora voluntária e Presidente do GRACE, em representação da Fundação Montepio, desde 2013. É ainda Oficial da Ordem de Mérito e autora de artigos e publicações científicas.

Paula Guimarães

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